Por Paulo
Stekel
Existe uma Mente
Una? Uma mente da qual todos fazemos parte? Quem afirma isso é o
notório Dr. Larry Dossey, um médico dos EUA, em seu livro “A
Conexão da Consciência” (Cultrix, 2018). A ideia parece ser uma
revivência do teísmo em bases mais científicas, mas a sua
principal afirmação é de que isso não se refere a Deus como foi
concebido pelas religiões.
A noção de uma
Mente Una, por vezes chamada de Mente Cósmica ou Mente Universal por
outros autores, é mais compatível com a noção indiana de Brahman
e (melhor ainda) Parabrahman, o Absoluto na visão pós-védica a
partir dos Upanishad.
Sobre Mente e
Consciência
Em uma nota no
início de seu livro, Dr. Dossey faz um esclarecimento sobre a
diferença entre mente e consciência:
“No fim da
década de 1980, tive a oportunidade de dar uma palestra a médicos
em Nova Délhi sobre evidências recém-surgidas de que a mente e a
consciência podem constituir fatores de muita influência na saúde
e na doença. Na discussão que se seguiu, um médico indiano já
idoso levantou-se e pediu-me, com muita gentileza: ‘Dr. Dossey, o
senhor poderia ser mais específico sobre o que entende por mente e
consciência? Na minha tradição, elas não são a mesma coisa.
Temos muitos níveis de consciência e muitos estados mentais.
Diga-nos a qual está se referindo’. Perdi o rebolado e gaguejei
uma patética pseudorresposta.
T. S. Eliot disse
certa vez, a respeito dos filósofos indianos: ‘Suas sutilezas
fazem quase todos os grandes filósofos europeus parecerem meros
alunos’. (…) Porém acredito que, para a maioria dos leitores
ocidentais, essas análises demasiadamente minuciosas da consciência
muitas vezes são desmotivantes. Quando ouvem que, no budismo, o
Kamaloka, o plano empírico/mundano da consciência, tem 54 estados e
que o Lokuttara, o plano transcendental, tem 40 estados, os olhos dos
ocidentais ficam completamente confusos.
(…) proponho as
seguintes ideias de K. Ramakrishna Rao, um dos eminentes filósofos e
pesquisadores da consciência contemporâneos da Índia. (…) muitos
cientistas e filósofos ocidentais compartilham dos pontos de vista
do professor Rao:
‘Na tradição
hindu, a consciência é mais que uma experiência de percepção.
Ela é um princípio fundamental subjacente a todo conhecimento e a
todo ser. Diversas formas de percepção manifesta são imagens da
consciência reveladas à pessoa como reflexos em sua mente. A
estrutura cognitiva não gera consciência; ela simplesmente a
reflete e, nesse processo, a limita e a embeleza. Em um sentido
fundamental, a consciência é a fonte de nossa percepção. Em
outras palavras, a consciência não é apenas a percepção nas
diferentes formas em que ela se manifesta; ela é também aquilo que
torna a percepção possível. No Kena Upanishad, afirma-se
que a consciência é o ouvido do ouvido, o pensamento do pensamento,
a fala da fala, o alento do alento e o olho do olho. (…) A
consciência é a luz que ilumina as coisas sobre as quais brilha.’
Tentar
compreender a consciência com a mente é um empreendimento vão.
Como disse o estudioso budista Alan Watts, esse esforço é como
tentar ver o olho com o próprio olho ou morder o dente com
o próprio dente, ou seja, é usar a ferramenta errada para o
trabalho.”
Aqui, é importante
esclarecer que, conforme a filosofia indiana, tanto budista quanto
hinduísta, a mente possui propriedades. Uma delas é a inteligência,
geralmente definida como a capacidade para resolver problemas. Outra
propriedade da mente é a consciência, em diversos graus. Se a
consciência for comparada a um espelho que reflete, a qualidade
deste espelho fará diferença na forma como ela reflete, o que seria
correlato aos níveis de consciência. O tipo de espelho definiria os
estados de consciência conforme os vários tipos de corpos em que a
consciência se manifesta. Os indianos acreditam em vários “reinos”
de existência, planos visíveis e invisíveis em que seres se
manifestam e nos quais possuem diversos graus de consciência. A
doutrina budista dos Seis Reinos de Samsara é toda baseada nesta
ideia, que vem da cosmologia indiana antiga. Então, resumindo, a
mente tem a propriedade de consciência em diversos graus e, esta,
possui inteligência em algum grau. Assim, todos os seres, de amebas
a seres humanos, estão conectados a uma Mente e possuem algum grau
de consciência e de inteligência. Diante desta filosofia,
desconfiamos que nossas definições para estes termos – mente,
consciência e inteligência – estão muito distantes da realidade
entendida pelos indianos.
O problema da
ferramenta
Dr. Dossey
prossegue: “Esse ‘problema da ferramenta’ já foi
identificado há muito tempo. Como disse Lao-Tzu, sábio chinês do
século VI a.C., a respeito do Tao, ou Caminho da Natureza, ‘O Tao
que pode ser expresso não é o Tao eterno; o nome que pode ser
definido não é o nome imutável’. Assim como acontece com o Tao,
acontece com a Mente Una.
Na primavera de
1933, os físicos Werner Heisenberg, Carl Friedrich von Weizsäcker e
Niels Bohr reuniram-se com alguns amigos em uma tosca cabana nas
montanhas da Baviera para passar um feriado esquiando. Naquela época,
Heisenberg e Bohr já eram famosos no cenário mundial da física.
Como descreve em seu livro Physics and Beyond, o próprio
Heisenberg ficou como cozinheiro do grupo, e Bohr foi encarregado de
lavar a louça. Heisenberg relata que certa noite, enquanto lavava a
louça após o jantar, Bohr começou a discutir as deficiências da
linguagem na descrição dos resultados de experimentos atômicos.
‘Nossa lavagem
da louça é igualzinha à nossa linguagem’, disse Bohr. ‘A água
é suja e os panos de prato também, mas, apesar disso, conseguimos
limpar os pratos e os copos. Na linguagem, também, temos de
trabalhar com conceitos pouco claros e com uma forma de lógica cujo
âmbito está restrito a um caminho desconhecido. Mas, apesar disso,
nós a usamos para levar algum esclarecimento à nossa compreensão
da natureza.’ O problema enfrentado por Bohr, Heisenberg e os
arquitetos da teoria quântica era o de não haver nada na
experiência humana que se comparasse às suas descobertas
experimentais e, por isso, o de não existir uma linguagem que as
descrevesse adequadamente.
Da mesma maneira,
o objetivo (…) de descrever a unificação das mentes individuais
em uma Mente Una coletiva e unitária, também não pode ser atingido
de modo satisfatório com a ferramenta da linguagem do autor.
(…) Os céticos
que sofrem de ‘aleatoriomania’ ou de ‘estatisticalite’
costumam subestimar as experiências das pessoas, alegando que, para
elas, tais experiências são ‘meras anedotas’. No entanto, são
‘anedotas’ essenciais para apreendermos a complementaridade entre
as mentes individuais e a Mente Una. Se uma imagem vale mil palavras,
a experiência de um indivíduo pode valer mil imagens. Não podemos
jamais eliminar o elemento pessoal, subjetivo, de nossas tentativas
de conhecer o mundo, nem mesmo de nossas tentativas científicas.
Como disse Max Planck, o principal fundador da física quântica: ‘A
ciência não pode solucionar o supremo mistério da natureza. E isso
porque, em última análise, nós mesmos somos parte da natureza e,
portanto, parte do mistério que tentamos solucionar’.”
Por que uma
“Mente Una”?
Na introdução de
seu livro, Dr. Dossey define seu conceito de “Mente Una” como
sendo: “(…) um domínio coletivo, unitário, de inteligência,
do qual fazem parte todas as mentes individuais. A Mente Una é uma
dimensão na qual você e eu podemos nos encontrar, como estamos
fazendo agora mesmo.
No século XX,
fomos apresentados a várias subdivisões da mente, como o
consciente, o pré-consciente, o subconsciente, o inconsciente, o
consciente coletivo e o inconsciente coletivo. A Mente Una é uma
perspectiva a mais de nossa paisagem mental. A diferença é que a
Mente Una não é uma subdivisão: ela é a dimensão de abrangência
global, totalmente inclusiva, à qual pertencem todos os componentes
mentais de todas as mentes individuais. Escrevo Mente Una (One
Mind) com maiúsculas para distingui-la da mente única (one
mind) que pertence a cada indivíduo.
(…) Há várias
maneiras de vivenciar a Mente Una. Imagine que ela seja uma fonte no
deserto à qual nos dirigimos para beber. Podemos chegar à fonte
sozinhos e ter uma experiência solitária. Ou podemos encontrar lá
outra pessoa, um grupo de pessoas ou talvez uma multidão. De modo
que, quando ‘bebemos’ da Mente Una, essa experiência pode nos
afetar de maneira exclusiva e individual, manifestando-se como um
conhecimento transcendente, uma epifania ou um avanço desbravador e
criativo. Ou podemos adquirir informações de uma maneira
inexplicável, como se ela se manifestasse por meio de uma revelação,
ou podemos ter uma premonição que se comprove verdadeira.
Alternativamente, as experiências da Mente Una podem envolver duas
ou mais pessoas, como acontece quando casais, irmãos, gêmeos,
amantes ou grupos de pessoas compartilham emoções, pensamentos ou
sentimentos à distância. (…) Embora infindavelmente variados, os
eventos associados à Mente Una têm isto em comum: eles envolvem uma
percepção ilimitada e de grande amplitude e extensão.”
Essa percepção é,
seguramente, extrassensorial, paranormal ou “mística”, para
alguns. É o terreno de pesquisa da Ciência Psíquica (a antiga
Parapsicologia) e entendida pelos indianos no contexto de “Siddhis”
ou poderes internos da mente que podem ser acessados pelo iogue como
um resultado de suas práticas. Se uma Mente Una conforme definida
pelo Dr. Dossey existisse, deveríamos esperar, como consequência de
sua existência, certos fenômenos verificáveis. Sim, ele responde,
e como consequências poderíamos esperar que:
“- Uma pessoa
pudesse compartilhar pensamentos e emoções (e até mesmo sensações
físicas) com um indivíduo distante com quem ela não está em
contato sensorial.
- Uma pessoa
pudesse demonstrar um conhecimento detalhado que estivesse de posse
de outra que já tivesse morrido, e que não poderia ter sido
adquirido por meios normais.
- Pudesse ocorrer
comunicação à distância entre seres humanos e criaturas não
humanas sencientes, como animais de estimação.
- Grandes grupos
de animais, como manadas, bandos e cardumes, pudessem comportar-se de
maneira tão estreitamente coordenada que se sugeriu para esse
fenômeno a existência de mentes compartilhadas, superpostas.
- Uma pessoa
prestes a morrer ou mesmo saudável pudesse entrar em contato direto
com um domínio transcendente no qual lhe fosse revelado que ela é
parte de uma mente maior, infinita no espaço e no tempo.
- Uma pessoa
pudesse encontrar objetos escondidos ou perdidos por meios
exclusivamente mentais, ou perceber em detalhes, sem contato
sensorial, cenas distantes conhecidas por outras.”
Todos estes
fenômenos são descritos na literatura mística e parapsicológica.
Para o Dr. Dossey, são provas da Mente Una. Para ele, “o
supremo argumento em favor da Mente Una é a não localidade da
consciência”, um conceito usado em física quântica. Isso
significa dizer, nas palavras do Dr. Dossey, que “as mentes
individuais não são apenas individuais”.
Ele prossegue: “Elas
não estão confinadas ou localizadas em pontos específicos do
espaço, como cérebros ou corpos, nem em pontos específicos do
tempo, como o presente. Em vez disso, as mentes são não
locais em termos espaciais e temporais. Isso significa que
a separação entre elas é uma ilusão, pois as mentes individuais
não podem ser encerradas em uma caixa (ou cérebro) e isoladas umas
das outras. Em certo sentido, todas as mentes se reúnem para formar
uma única mente.
(…) Cunhei a
expressão ‘mente não local’ em 1989, no livro Reencontro com
a Alma: Uma Investigação Científica e Espiritual, para
expressar aquilo que acredito ser um aspecto espacial e
temporariamente infinito de nossa consciência. (…) a mente não
local é semelhante ao antiquíssimo conceito da alma.”
Sobre o autor
Dr. Larry Dossey é
líder em seu campo de estudos, levando compreensão científica à
espiritualidade e o rigor das provas à medicina integrativa e
complementar. Profissional de medicina interna e ex-diretor médico
do Medical City Dallas Hospital, é um defensor internacional da
importância da mente para a saúde e autor do best-seller “As
Palavras Curam” (Cultrix), primeiro livro a abordar em profundidade
o modo como a compaixão e a prece afetam a cura.
Se você deseja
adquirir o livro “A Conexão da Consciência”, do Dr. Larry
Dossey, acesse diretamente o link de vendas da Editora Cultrix:
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