Por Paulo Stekel
1
- Introdução
O que é
Consciência? Ainda que a resposta pareça óbvia para qualquer
pessoa que já tenha estado ou visto alguém inconsciente, não é
tão simples assim. Nem cientistas, nem filósofos e nem mesmo as
espiritualidades do mundo entram em consenso quanto ao que sejam
coisas como mente e consciência. A grande verdade é que só podemos
entender consciência a partir de seus efeitos, de sua fenomenologia.
Mas, isso não significa que os efeitos, o modo como o fenômeno se
nos aparece, seja “a” consciência em si. Para uns, ela é o
efeito, o produto, o epifenômeno da atividade neuronal. Para outros,
é a emergência de um sistema inteiro – o corpo. Para outros, vem
de fora do cérebro, de um não-local ou de um “Campo A”, como
propõe Ervin Laszlo.
Estudo o tema mente
e consciência, que se encaixa no que se chama “filosofia do
espírito” ou “filosofia da mente” e, mais recentemente,
“filosofia da consciência”, há muitos anos. Uma de minhas
primeiras influências no começo deste estudo foi o físico
americano nascido na Grécia
Menas Kafatos (se você lê em
inglês, confira seu interessante website:
https://www.menaskafatos.com),
do qual li o livro “Consciência e Cosmos”, publicado no Brasil
pela Editora Teosófica - dados do original em inglês: Kafatos, M.,
and Kafatou, T. (1991)
Looking In, Seeing Out:
Consciousness and Cosmos, Quest Books, ISBN:
978-0835606745.
Kafatos alia física
quântica, um monismo semelhante ao de Deepak Chopra e Amit Goswami,
flerta com a neurociência, a Filosofia Perene e imagina o Universo
como sendo consciente. Isso tem muito a ver com a teoria do
Pampsiquismo, também preferida de David Chalmers, um filósofo
australiano, notabilizado por seus estudos em Filosofia da mente e
que cunhou a expressão “the hard problem of consciousness”,
o problema difícil da consciência.
O principal livro de
Chalmers (seu site em inglês:
http://consc.net/),
“The Conscious Mind” (1996), é considerado no meio científico e
filosófico como sendo um trabalho essencial sobre a consciência e
sua relação com o dilema mente-corpo na filosofia da mente. Ele
afirma que todas as formas de Fisicalismo (reducionista ou não), que
dominam a filosofia e ciência modernas não são suficientes para
provar a existência (a presença na realidade) da consciência em
si. Por isso, propõe uma alternativa dualista (mas que também
poderia ser caracterizada por formulações mais tradicionais, como
dualismo de propriedades, monismo neutro, ou teoria do duplo
aspecto). Também é um defensor do
Pampsiquismo, a visão de
que a mente ou um aspecto semelhante a ela é uma característica
fundamental e onipresente da realidade.
Muitos pampsiquistas
atuais sustentam que a senciência ou a experiência subjetiva é
onipresente, embora distanciam essas qualidades dos complexos
atributos mentais humanos. Contudo, atribuem uma forma primitiva de
mentalidade a entidades no nível fundamental da física, mas não a
atribuem à maioria dos agregados, como rochas ou edifícios. Por
outro lado, alguns teóricos históricos imputaram atributos como
vida ou espírito a todas as entidades, o que é contestado por Steve
Taylor, um psicólogo transpessoal britânico que, para contrapôr-se
a esta ideia, cunhou outro termo:
Panespiritismo (ou
Panspiritismo). Confira seu interessante site em inglês:
http://www.stevenmtaylor.com/.
A ideia deste artigo
é apresentar as principais hipóteses envolvendo a pesquisa
científica, filosófica e espiritual sobre a mente e a consciência.
Apresento aqui uma classificação em cinco hipóteses principais,
com suas variações. Como cheguei a esta lista? Na verdade, baseado
nas centenas de livros que li em minha vida sobre o tema. Ao longo de
décadas fui mudando minhas posições sobre o assunto, e a noção
desta classificação foi se formando naturalmente.
Mas, para facilitar
o entendimento da classificação a seguir, é necessário
apresentarmos algumas definições importantes. Dois tipos de
definições nos interessam. As duas primeiras são a diferença
entre Pampsiquismo e Panespiritismo. O segundo tipo são as
definições de três conceitos que permearão as cinco hipóteses
apresentadas na sequência: Teísmo/Ateísmo, Alma-Espírito e
Reencarnação/Renascimento.
2
- Pampsiquismo e Panespiritismo
Já expliquei em
outro artigo as diferenças entre as duas noções, e as reproduzo a
seguir.
“O
pampsiquismo, a ideia de uma consciência universal, é um
pensamento relevante presente em alguns ramos da filosofia da Grécia
antiga, do paganismo e do budismo. Até recentemente, vinha sendo
largamente desvalorizado pela ciência moderna.
No seu trabalho
sobre consciência, Koch colaborou com o pesquisador Giuliu Tononi.
Tononi é o pai da teoria da consciência mais aceita atualmente, a
chamada Teoria da Informação Integrada (TII), à qual Koch
se referiu uma vez como sendo ‘a única teoria fundamental da
consciência que é verdadeiramente promissora.’
A teoria de
Toroni defende que a consciência apresenta-se em sistemas físicos
que contêm muitas partes diferentes de informação altamente
interligadas. Baseado nesta premissa, a consciência pode ser
mensurada como uma quantidade teórica, a que os cientistas chamaram
de phi.
(…) Existe já
uma necessidade prática premente para encontrar uma forma de medir a
consciência. Médicos e cientistas poderão usar o phi para
saber se uma pessoa em estado vegetativo está efetivamente morta,
qual o estado de consciência de uma pessoa demente, quando é que o
feto desenvolve consciência, qual o grau de percepção dos animais
ou, até mesmo, se um computador é capaz de sentir.
(…) A TII casa
igualmente esta aplicação prática com ideias muito profundas. A
teoria diz que qualquer objeto com um phi maior
do que zero tem consciência. Isto significa que animais, plantas,
células, bactérias e se calhar ate os prótons são seres
conscientes.
(…) O budismo
associa a mente à senciência. O falecido Traleg Kyabgon Rinpoche
declarou, uma vez, que enquanto a mente, junto com os objetos, é
vazia, é porém, ao contrário deles, luminosa. Com sinal
semelhante, a TII afirma que a consciência é uma qualidade
intrínseca a tudo, porém apenas se revela de forma significativa em
determinadas condições – no mesmo sentido como tudo é possuidor
de massa, mas apenas objetos maiores possuem gravidade perceptível.
(…) Christof
Koch, o qual começou a interessar-se pelo budismo durante os seus
tempos de faculdade, diz que a sua visão do mundo é coincidente com
os ensinamentos budistas sobre o ‘não eu’, impermanência,
ateísmo e pampsiquismo.
(…) No Mosteiro
de Drepung, o Dalai Lama disse a Christof Koch que Buda ensinou que a
senciência está em todos os lugares a vários níveis e que os
humanos devem ter compaixão por com todos os seres sencientes. Até
aquele momento, Koch ainda não se havia apercebido do peso desta
filosofia.”
A ideia de um
“universo consciente” é pampsiquista. É como se tudo tivesse
consciência. Contudo, Steve Taylor, em seu livro ainda não
traduzido, “Spiritual Science”, faz uma bela diferença entre
Pampsiquismo e o que ele
chama de Panspiritism (podemos traduzir por
“Panespiritismo” ou mesmo “Panspiritismo”) – todos os
trechos do livro de Taylor neste artigo foram traduzidos por Paulo
Stekel:
“Eu chamo essa
perspectiva de panespiritismo. Literalmente, ‘pan’
significa ‘tudo’ ou ‘todo’, então panespiritismo
literalmente significa ‘todo-espírito’ ou ‘tudo é espírito’.
Isso é semelhante a outra abordagem filosófica, chamada
pampsiquismo (que literalmente significa ‘tudo-mente’). No
entanto, existem algumas diferenças significativas. O
pampsiquismo sugere que as partículas mais básicas da matéria têm
alguma forma de ser interior e alguma forma de experiência; não
concebe uma força espiritual que permeia todas as coisas, incluindo
o espaço vazio. O panespiritismo sugere que a força espiritual
permeia todas as coisas, mas não necessariamente que as imbui em uma
vida interior. (Na minha opinião… alguma forma de consciência
ou sensibilidade e experiência só surge com as primeiras formas de
vida simples.)”
Esta é uma
diferença crucial. Esta “força espiritual” que permeia a tudo é
compatível com a ideia de Campo A (ou “akáshico”), criada pelo
cosmologista húngaro Ervin Laszlo. Este campo permeia tudo, mas não
necessariamente equivale a dizer que há uma vida interior em tudo.
Para Laszlo, a principal qualidade do Campo A é informação. É
isto que ele transmite. Então, consciência é um processo um nível
acima do informacional. A confusão entre Pampsiquismo e
Panespiritismo estaria exatamente aí: para um panespiritista, a
informação é um estágio subjacente ao estágio de consciência,
sendo que este último não se manifesta em tudo. Para os
pampsiquistas, informação e consciência permearia a tudo. É uma
diferença importante de se entender. A visão sistêmica será um
argumento que utilizaremos adiante para justificar a hipótese
panespiritista de emergência a partir de níveis, evitando o
nivelamento do pampsiquismo.
Para esclarecer de
vez a diferença entre os dois conceitos, Taylor, em “Spiritual
Science”, diz, flertando com a visão sistêmica:
“(…) uma
das principais diferenças entre panespiritismo e
pampsiquismo é que o primeiro não
sugere que todas as coisas tenham sua própria mente ou ser interior
e, portanto, sua própria experiência. Minha
opinião é que, embora a força
espiritual esteja em todas as coisas, nem todas as coisas têm seu
espírito individual. Ou, para ser mais
claro, embora a consciência esteja em
todas as coisas, nem todas as coisas são conscientes.
Ou seja, nem todas as coisas têm sua
própria consciência individualizada.
Somente as estruturas - começando pelas
células - que possuem a complexidade e a forma organizacional
necessárias para receber e canalizar a consciência são
individualmente conscientes e individualmente vivas. Na
minha opinião, esta é a função principal das células: facilitar
a canalização da força espiritual em seres individuais. Uma célula
atua como um ‘receptor’ da consciência, de modo que até uma
ameba tem seu próprio tipo muito rudimentar de psique e, portanto, é
individualmente viva. E à medida que os
seres vivos se tornam mais complexos - à medida que suas células
aumentam em número e se organizam de maneira mais complexa - eles se
tornam capazes de ‘receber’ mais consciência. A
essência bruta da consciência é canalizada de maneira mais
poderosa através deles, e eles se tornam mais intensamente vivos,
com mais autonomia, mais liberdade e uma percepção mais intensa da
realidade. É por isso que os seres
humanos, com cérebros incrivelmente complexos e intrincados, são um
dos seres mais conscientes (talvez ao lado de golfinhos e baleias)
que a evolução já desenvolveu.
No
entanto, as formas mais simples de matéria, que não possuem
células, não são capazes de canalizar a consciência e, portanto,
não são conscientes ou vivas individualmente. Formas simples de
matéria não têm interior e não são capazes de experiência ou
sensação. Estes só emergem no nível celular e acima.
De
certo modo, todas as coisas estão vivas, como muitos povos indígenas
acreditam, uma vez que são permeadas pela consciência ou força
espiritual. Mas há uma diferença na maneira como as rochas e os
rios estão vivos e na maneira como um inseto ou até uma ameba estão
vivos. Rochas e rios não têm
sua própria psique e, portanto, não têm consciência individual. A
consciência os invade, mas eles não são conscientes. Não podem,
porque não possuem células - e muito menos cérebros ou sistemas
nervosos - para canalizar a consciência.
Portanto,
existe uma distinção entre seres
conscientes individuais e a
consciência como um todo.
Os seres individuais ainda existem, com células ou cérebros que
canalizam a força espiritual onipresente para eles em diferentes
graus. Há uma distinção entre coisas materiais, que são permeadas
de força espiritual (sem ter suas próprias mentes interiores) e
seres vivos, que são permeadas de força espiritual e também têm
sua própria mente ou consciência interior.
A
força do espírito, portanto, se manifesta de duas maneiras: como
matéria e mente. Você poderia dizer
que a matéria é a manifestação externa do espírito, enquanto a
mente é sua manifestação interna. Toda matéria é a manifestação
do espírito, mas algumas formas complexas da matéria também têm o
espírito como uma qualidade interna. Outra maneira de encarar isso é
pensar em termos de dois estágios diferentes. O primeiro estágio,
no início do universo, 13,7 bilhões de anos atrás, foi o
surgimento da matéria fora do espírito. O segundo estágio, que
ocorreu cerca de nove bilhões de anos depois, foi o surgimento da
mente na matéria, que começou com as primeiras formas de vida
simples. (Pelo menos, esse processo começou na Terra nove bilhões
de anos depois - pelo que sabemos, pode ter acontecido anteriormente
em outros planetas.)”
Este último
parágrafo invoca, nitidamente, as ideias da visão sistêmica
defendida por Fritjof Capra e outros.
3
- Deus, Espírito e Renascimento
Todas as cinco
hipóteses para a consciência analisadas no próximo tópico
dependem muito de como cada uma considera três conceitos comuns às
religiões, espiritualidade e filosofias de todos os tempos: Deus,
Espírito e Renascimento.
Comecemos com o
conceito de “Deus”. As hipóteses a se analisar adiante
consideram este princípio de modo positivo (Teísmo), negativo
(Ateísmo) ou neutro (Não-teísmo). A ciência cartesiana tem como
base um ateísmo, religiões abraâmicas são teístas e outras, como
o budismo e o taoismo, podem ser consideradas não-teístas.
Steve Taylor, em
“Spiritual Science”, argumenta claramente sobre a noção de Deus
nas filosofias religiosas:
“Nas
tradições contemplativas associadas às religiões monoteístas do
judaísmo, cristianismo e islamismo, a força espiritual costumava
ser associada a Deus. Nessas tradições, Deus não era interpretado
como um ser pessoal que negligencia o mundo e controla seus eventos,
mas como uma energia ou força espiritual impessoal e sem forma que
irradia por toda a criação, trazendo todas as coisas para a
unidade. Também irradia através da alma humana, de modo que somos
essencialmente um com Deus. Os místicos cristãos se referiam à
força espiritual como a ‘divindade’ ou ‘escuridão divina’.
No misticismo judaico da Cabala, isso era chamado en
sof - literalmente, ‘sem
fim’.
Certamente há alguma variação entre esses
conceitos devido aos conceitos dos sistemas religiosos ou metafísicos
aos quais eles estavam associados. (Por exemplo, o Tao
é mais dinâmico e tangível que o Brahman,
e nas tradições monoteístas a força espiritual é geralmente
vista como transcendente e imanente.) No entanto, a similaridade
essencial dos conceitos - e sua similaridade com os conceitos de
espírito-força dos povos indígenas, e
com os conceitos gregos antigos de pneuma
e anima mundi
- é muito impressionante. Parece que estamos
lidando com uma qualidade fundamental do mundo que pode ser percebida
diretamente. A qualidade pode ser interpretada de maneira um pouco
diferente, da perspectiva de diferentes tradições, da mesma maneira
que, digamos, uma paisagem pode ser descrita diferentemente por
pessoas que a olham de diferentes pontos de vista. Nas palavras do
monge cristão e hindu Bede Griffiths: ‘Este é o grande Dao
[Tao]... É o
nirguna brahman...
É o dharmakaya do
Buda, o ‘corpo da realidade’... É o de Plotino que está além
da Mente (o Nous)
e só pode ser conhecido em êxtase. Em termos cristãos, é o abismo
da Divindade, a ‘escuridão divina’ de Dionísio, que ‘excede
toda a existência’ e não pode ser nomeada, da qual as Pessoas da
Divindade são as manifestações.”
Aqui, algumas coisas
parecem ter sido misturadas por Taylor, evidenciando uma tendência
ao
Perenialismo (saiba o que é:
http://dicionario.sensagent.com/perenialismo/pt-pt/),
algo que me parece forçado filosoficamente falando. Reconheço
publicamente que não sou guenonista, apesar de saber que dizer isso
enfurece os fãs de René Guénon. Já fui fã da teosofia de
Blavatsky, mas hoje isso é passado, e retenho pouca coisa daquela
fase. Descarto tanto o Perenialismo evidente de Frithjof Schuon
quanto o velado de Ken Wilber.
Voltando à citação
de Taylor, temos que entender a diferença entre a visão imanentista
e a visão transcendentalista de Deus.
O Transcendentalismo
ao qual nos referimos não é apenas o chamado “transcendentalismo
kantiano”, mas o conceito utilizado em filosofia religiosa como uma
doutrina filosófica e religiosa norte-americana, difundida
especialmente pelo poeta Ralph Waldo Emerson (1803-1882), conhecida
como “transcendentalismo estadunidense”, que prega a existência
de um estado espiritual transcendendo o físico e estabelecendo a
possibilidade de se perceber o empírico por meio de uma sábia
consciência intuitiva. Por extensão, acaba sendo qualquer doutrina
que adota métodos como intuição, fé ou revelação, por
transcenderem a razão e o empirismo do conhecimento humano, e é
este último sentido que nos interessa aqui. Nesta visão, “Deus”,
como entendido pelas religiões abraâmicas e outras, é um “algo”,
na verdade, um Ser, que transcende a realidade material e só pode
ser percebido pela intuição ou por meios espirituais e invisíveis,
não mensuráveis cientificamente.
O Imanentismo,
por outro lado, em filosofia e teologia, se refere a qualquer
doutrina que postula a existência de uma divindade imanente em todo
o Universo criado, inclusive nos indivíduos. Ou seja, um “Deus”
que permeia a tudo, não separado do mundo material, como pensam os
transcendentalistas. O imanentismo teológico e metafísico sustenta
que Deus abrange ou se manifesta no mundo material, e Deus, mente ou
espírito abstrato pervade o mundo. Giordano Bruno era imanentista
evidente.
Então, podemos
falar em um Deus Imanentista (integrado, que permeia toda a
realidade, material e espiritual) e um Deus Transcendentalista
(separado, que transcende a realidade material, pertencendo a uma
realidade espiritual). O Deus Transcendentalista é dualista,
enquanto o Imanentista é panteísta, sistêmico, engajado na
realidade total. Escolha sua visão de Deus no balcão de
oportunidades!
Agora, o
conceito de “Espírito”. Seu principal significado se refere
à energia vital que se manifesta no corpo físico. Mas, a palavra
“espírito” é muitas vezes usada pela metafísica para se
referir à consciência ou à personalidade. Às vezes, “espírito”
se confunde com “alma” - o espírito num ser vivente (a distinção
entre alma e espírito só ocorreu com a atual terminologia
judaico-cristã), é entendido como “fantasma” e ainda como a
manifestação energética de um falecido (conceito comum no
Espiritismo). Por fim, o termo ainda se refere a qualquer entidade
incorpórea ou imaterial (demônios, divindades, deidades, etc.), em
vários contextos religiosos e espirituais.
Não podemos
ignorar, sob pena de erros crassos, que a palavra espírito é usada
em dois contextos, o metafísico e o metafórico. Em filosofia,
espírito é o conjunto total das faculdades intelectuais; em
religião e filosofia espiritualista, é um princípio ou essência
da vida incorpórea; em neurociências, é um princípio material
(conjunto de leis da física que geram nosso sistema nervoso); em
psicologia, é a atitude mental dominante de uma pessoa ou de um
grupo; para a espiritologia (ou “psicologia espiritual”), é o
corpo psíquico, que entra em contato com a quarta dimensão (ou
Mundo Astral), onde não existem problemas de espaço ou tempo; para
o espiritismo codificado por Kardec, é o princípio inteligente do
Universo que, quando encarnado, é chamado de alma, mas sendo alma e
espírito essencialmente a mesma coisa, e que quando reencarna para
se aperfeiçoar, mantém a personalidade e as características
individuais; em Teosofia, é associado aos dois princípios mais
elevados do Homem, o Atman-Buddhi, a essência
imortal do Homem. Escolha, então, sua visão de “espírito” para
efeito das hipóteses que seguirão em breve.
Por fim, o
conceito de “Reencarnação” e de “Renascimento”. Por que
a diferença? Simples! O conceito de “reencarnação” é
relacionado às doutrinas que acreditam num espírito como algo
separado do corpo, uma essência que reencarna, que adentra um corpo,
múltiplas vezes ao longo da eternidade. É o caso do espiritismo e
do hinduísmo. O conceito de “renascimento” é relacionado
a doutrinas que não acreditam num espírito como uma essência
transcendente que migra de vida a vida, mas só concebe um continuum
mental de consciência que anima novos corpos. É o caso da visão
budista. Esta ideia de continuum mental do budismo é muitas
vezes difícil de se entender, mas encontro paralelos com a teoria do
Campo A de Ervin Laszlo e, um pouco de longe, com a teoria da Mente
Una do Dr. Larry Dossey.
Seja reencarnação
ou renascimento, ambas as doutrinas se valem do conceito de “karma”
(ação) e de seus “frutos” ou resultados (karma e
vipaka), também chamado de “lei de causa e efeito” por
alguns, como forma de justificar a necessidade de um retorno ao mundo
físico. Escolha, então, se você acha que retorna ou não da
próxima vez!
4
– Cinco Hipóteses para a Consciência
Depois de
introduzidos todos os conceitos necessários, agora podemos passear
pelas hipóteses que temos disponíveis até aqui para explicar o
fenômeno da Consciência, em suas várias implicações. Importante
esclarecer que muitas vezes a palavra “consciência” se permuta
com “mente” e “espírito”. As tradições espirituais
preferem a palavra “espírito”, a filosofia prefere “mente” e
as neurociências, sejam materialistas ou espiritualistas, preferem o
termo “consciência”. Como esclareci no início, as cinco
hipóteses apresentadas aqui são o produto de décadas de estudo
sobre o tema. São o resultado de centenas de leituras em áreas das
mais diversas, como ciências, neurociências, inteligência
artificial, religiões, tradições espirituais, filosofia, física,
cosmologia, espiritualismo, teoria dos sistemas, visão sistêmica,
teoria integral e nova espiritualidade, dentre outras. São elas:
A – Hipótese
Materialista
Filosoficamente,
materialismo é o fisicalismo que sustenta que a única coisa
da qual se pode afirmar a existência é a matéria. Para um
filósofo ou um cientista materialista, absolutamente todas as coisas
são compostas de matéria e todos os fenômenos são o resultado de
interações materiais. A matéria é a única substância aceita.
Esta ideia se opõe
quase frontalmente ao idealismo e, de modo absolutamente frontal, à
metafísica. Quando o assunto é a mente, o pensamento e a
consciência, a oposição é clara. Para o materialismo científico
de Marx e Engels, o pensamento se relaciona a fatos puramente
materiais (essencialmente mecânicos) ou constituem um epifenômeno.
Uma nota importante
sobre a palavra “epifenômeno” se faz necessária. Epifenômeno
é a condição de alguma coisa “sobre” ou “acima” do
fenômeno, derivando de uma causa primária, sendo seu produto
direto. A visão epifenomênica da neurociência diz que a “mente”
é produzida por algum fenômeno, que neste caso, deduz serem os
processos cerebrais o “fenômeno da mente”. Então, nesta teoria,
a mente é um epifenômeno das atividades cerebrais. Isso difere da
corrente neurocientífica “espiritual” e da espiritualidade em
geral, que afirma que a mente é um fenômeno por si mesmo,
independente do cérebro, a razão única ou causa de si mesma, sendo
ela que manifesta o que chamamos de “consciência”.
A hipótese
materialista para a mente e a consciência é a da Ciência
Cartesiana e da maior parte dos neurocientistas atuais. Dois exemplos
são Frank Amthor e Richard Dawkins. É uma hipótese totalmente
ateia, evolucionista, não-reencarnacionista, onde não há lugar
para o “espírito”. A mente e a consciência seriam processos
resultantes da atividade dos neurônios, nada mais.
A principal
provocação que se pode fazer à hipótese materialista é a
proposta por David Chalmers. Para ele, existe o “problema fácil da
consciência” e o “problema difícil da consciência”. Steve
Taylor, em “Spiritual Science”, explica:
“Em
termos mais contemporâneos, essa questão pode ser enquadrada em
termos de como a consciência emerge do cérebro. David Chalmers
refere-se a isso como o ‘problema difícil’ - o problema de como
a massa cinzenta e encharcada de matéria que chamamos de cérebro dá
origem à riqueza e variedade de nossa experiência consciente.
Segundo Chalmers, é altamente improvável que alguma vez possamos
explicar a consciência em termos neurológicos. Como resultado,
devemos procurar uma explicação alternativa, que é porque, como a
consciência ‘não parece derivável das leis físicas’, ela deve
ser ‘considerada uma característica fundamental, irredutível a
algo mais básico’. Chalmers salienta
que os físicos do século XIX perceberam que os fenômenos
eletromagnéticos não podiam ser explicados em termos do
conhecimento atual e, portanto, introduziram o princípio da carga
eletromagnética como uma qualidade fundamental do universo. E o
mesmo deve se aplicar à consciência. Como
não pode ser explicada em termos das teorias atuais e não é
redutível a nenhuma outra qualidade no universo, deve ser vista como
uma qualidade fundamental. Segundo
Chalmers, os físicos não serão capazes de desenvolver uma ‘teoria
de tudo’ coerente até que levem em conta a consciência como uma
qualidade fundamental.”
O que Taylor e
Laszlo chamam de qualidade fundamental da consciência no universo, a
visão sistêmica de Capra e de outros chama de aspecto emergente da
consciência a partir de sistemas mais complexos.
Steve Taylor
apresenta em “Spiritual Science” uma ótima contestação da
visão materialista da consciência como produto do cérebro, base da
hipótese materialista, que também poderíamos chamar de
“neuromaterialista”:
“(...)
o filósofo escocês Donald MacKay sugeriu que a consciência está
relacionada a interações entre a camada cortical e outras camadas
mais profundas do cérebro; o neurocientista Rodney Cotterill sugeriu
que o local da consciência é o cingulado anterior, enquanto V.S.
Ramachandran - um dos neurocientistas mais eminentes de todos -
sugeriu que o ‘circuito’ da consciência reside tanto nos lobos
temporais quanto em parte do lobos frontais chamados giro cingulado.
(…)
Quando existe tão pouco consenso
nas explicações, isso sugere que a suposição causal subjacente às
explicações (neste caso, o cérebro produz consciência) é
duvidosa. De fato, a ideia de que
a consciência provém de uma área específica do cérebro agora foi
largamente descartada pelos teóricos, em favor da visão de que a
consciência é de alguma forma gerada pelo cérebro como um todo.
Como afirmou o neurocientista Giulio
Tononi, “a consciência está associada a um sistema neural
distribuído: não existe uma área única onde tudo se reúna”.
Mas ainda ninguém apresentou uma teoria viável de como todo o
cérebro pode produzir consciência.
(…)
muitos filósofos sugeriram que a
própria suposição de que o cérebro produz consciência deveria
ser abandonada. Se você
segurasse um cérebro na mão, descobriria que é um
amontoado de massa cinzenta, um pouco parecido com massa de
vidraceiro e quase tão pesado quanto um saco de farinha. Como é
possível que esse material cinza encharcado possa dar origem à
riqueza e profundidade de sua experiência consciente? Essa presunção
é um ‘erro de categoria’. A matéria física do cérebro - não
importa quão complicadas sejam as interações entre as células -
pertence a uma categoria de substância, e os qualia
não-físicos de experiências conscientes
pertencem a outra, de modo que como ela pode ser explicada em termos
da primeira?
(…)
Alguns filósofos sugeriram que a
consciência é uma propriedade ‘emergente’, que naturalmente
surge quando a matéria atinge um certo nível de complexidade.
No entanto, isso é apenas uma descrição e não uma explicação.
Como ninguém foi capaz de explicar como a consciência pode emergir
da matéria, é apenas uma reafirmação do problema. E, em qualquer
caso, quando uma propriedade emerge dos componentes mais básicos de
um sistema, essa propriedade é normalmente inerente a esses
componentes e pode ser deduzida deles. Mas não há nada na
experiência consciente que seja relacionado às coisas físicas do
cérebro.
(…)
O filósofo
australiano David Chalmers se referiu a isso como o ‘problema
difícil’ [orig. hard
problem]. Na opinião de Chalmers, existem
alguns aspectos da relação entre atividade cognitiva e atividade
cerebral que psicólogos e neurocientistas entendem bastante bem. Por
exemplo, temos uma ideia bastante boa das funções cerebrais
envolvidas na memória, atenção e processamento de informações.
Mas esses são apenas - na terminologia de Chalmers - os ‘problemas
fáceis’[orig.
easy problems]. O problema de como o cérebro pode dar origem à
consciência está em uma escala completamente diferente. O ‘problema
difícil’ pode não ser solúvel.
Isso também foi
descrito como a ‘lacuna
explicativa’
[orig. explanatory gap]. Mesmo se, de
alguma forma, conseguimos identificar com precisão as redes neurais
associadas à consciência, o que isso nos diria? Ainda haveria um
abismo entre as coisas físicas do cérebro e a riqueza da
experiência consciente. (...)
Como Christof Koch, explicando por que duvidou das explicações
neurológicas de consciência, colocou: (…)
a consciência é ‘inerente ao
design do universo’.
David Chalmers ilustrou isso com
seu conceito de “zumbi”. Imagine que há uma versão zumbi de
você que se parece exatamente, fala exatamente e se comporta
exatamente como você, e só é diferente de você por não ter
experiência consciente. É exatamente o mesmo que você, exceto que
não existe um eu que reflita e experimente sensações
por dentro. Não há ninguém para pensar no que você está fazendo,
comentar sobre sua experiência ou tomar planos ou decisões.
Chalmers acredita que, hipoteticamente, essa versão zumbi de você
poderia sobreviver no mundo. Você poderia funcionar perfeitamente
bem no mundo sem experiência consciente. E não há nada na sua
forma física que exija experiência consciente. Isso significa que a
consciência é ‘algo extra’, algo além do material físico de
nossos cérebros e corpos que não pode ser reduzido a eles.”
Esta “consciência
zumbi” de Chalmers só seria possível em Inteligência Artificial,
e seria algo muito diferente do que entendemos por consciência. Por
causa deste argumento, muitos especialistas em Inteligência
Artificial e filósofos da mente duvidam que algum dia máquinas
possam apresentar uma consciência como a nossa ou mesmo superior. Eu
mesmo, duvido muito!
B –
Hipótese Metafísica
Também pode ser
chamada de “hipótese vitalista” ou “hipótese espiritualista”
(definição inicial que havia escolhido para esta segunda hipótese),
abarcando espiritualistas, espíritas, reencarnacionistas e quem
acredita na noção de “alma” e “espírito”. Na verdade, a
hipótese metafísica pode ter várias correntes sobrepostas: teísta,
ateísta, não-teísta; reencarnacionista, não-reencarnacionista;
imanentista, transcendentalista, etc. A mescla pode resultar em até
duas dezenas de vertentes. Algumas serão evolucionistas, outras não.
A palavra
“vitalista” aqui se refere à crença dos expoentes desta
hipótese em um princípio vital, que anima os seres, um princípio
energético ou um poder que pode ser sentido, transmitido e recebido
por outro ser. Neste sentido, são vitalistas todas as práticas
espíritas, xamânicas e animistas da humanidade. Têm como
característica quase generalizada a crença em Deus (ou deuses) e um
“espírito” (desde a ideia de energia até a de entidades). Para
esta hipótese, a mente e a consciência seriam algo “fora” do
complexo neural (do corpo) a animá-lo (por isso “vitalista”).
Um bom exemplo aqui
é o Dr. Sérgio Filipe de Oliveira (um cientista espírita
brasileiro). Na verdade, existem muitos “neurocientistas
espiritualistas” ou “espíritas” que se encaixariam
perfeitamente nesta hipótese. Muitos pesquisadores ligados ao
movimento antigamente chamado de “new age”, a terapias
complementares, medicina integrativa e à física associada à
espiritualidade também apresentam ideias que se conectam a esta
hipótese.
Taylor, em
“Spiritual Science”: “Na forma
mais antiga do budismo - geralmente chamada de budismo Theravada -
não há um conceito aberto de força espiritual (embora alguns
estudiosos tenham sugerido que shunyata
- geralmente traduzido como ‘vazio’ -
possa ser interpretado dessa maneira). No entanto, no budismo
Mahayana
(que se desenvolveu um pouco mais tarde que o Theravada), existe o
conceito de dharmakaya,
que é semelhante ao Brahman.
Dharmakaya é
a realidade subjacente do universo, da qual todas as coisas emergem e
na qual todas as coisas são uma. Como o professor budista D. T.
Suzuki o descreveu, o dharmakaya tem qualidades de ‘amor que
engloba e inteligência onisciente’ e iluminação significa
realizar o dharmakaya dentro de nosso próprio ser.”
Esta noção
colocaria o budismo mahayana próximo da hipótese metafísica, mas
creio que não é o caso, como veremos mais adiante.
Mas, qual o problema
com a hipótese metafísica do modo como exposto aqui? A ideia de que
a consciência seria algo externo ao complexo neural, uma força
vital com existência independente não resiste a algumas
investigações neurocientíficas. Isso significa que os dois lados
possuem explicações incompletas. Não se pode negar que a
consciência tem “relação” com os processos neurais, embora
isso não signifique que o cérebro gere a consciência a partir de
sua neuroquímica e bioeletricidade. Por outro lado, não se pode
negar que a consciência é mais do que neuroquímica e
bioeletricidade, como afirmam os metafísicos, embora isso não
signifique que haja uma força independente da qual o cérebro é só
um retransmissor ou um captador. É necessária uma harmonização
entre as duas ideias, o que parece tarefa para a próxima hipótese.
C – Hipótese
Sistêmica
Vem da “Visão
Sistêmica”, que pertence ao chamado “Pensamento Sistêmico”
(um componente do paradigma emergente), que é uma forma de abordagem
da realidade que surgiu no século XX, e que se contrapõe ao
mecanicismo reducionista e materialista. Não nega a racionalidade
científica, mas acredita que ela não oferece parâmetros
suficientes para a humanidade e a descrição do universo material.
As deflagradoras do
pensamento sistêmico foram coisas como a complexidade da mecânica
quântica (que tornou o universo de Newton defasado), as novas ideias
da biologia sobre a vida (Maturana, Varela, Sheldrake e Lovelock) e
inovações na medicina e nas ciências humanas. Ou seja, a
interdisciplinaridade é uma das bases do pensamento sistêmico.
A partir disto, a
“Visão sistêmica” consiste na habilidade em compreender os
sistemas de acordo com a Teoria Geral dos Sistemas
(Bertalanffy), ou seja, ter o conhecimento do todo, de modo a
permitir a análise ou a interferência no mesmo. Capra diz que o que
hoje convém chamar de “visão sistêmica” era antes conhecido
por “visão holística”. Holístico e sistêmico, neste sentido,
são sinônimos. Significa ver as ligações de fatos particulares do
sistema como um todo.
E, como é visto um
sistema nesta visão? Como algo composto por partes, com todas as
partes do sistema se relacionando de forma direta ou indireta,
limitado pelo ponto de vista do observador, podendo abrigar outro
sistema e vinculado ao tempo e espaço.
O que a hipótese
sistêmica propõe para a consciência é que ela é uma emergência
do processo biológico que chamamos de “vida”. Porém, a visão
sistêmica de vida se baseia na teoria da autopoiese de
Maturana e Varela, segundo a qual os seres vivos têm a capacidade
natural de produzir a si próprios. Segundo esta teoria, um ser vivo
é um sistema autopoiético, e, como sistema autônomo, está
constantemente se autoproduzindo, autorregulando, e sempre mantendo
interações com o meio, onde este apenas desencadeia no ser vivo
mudanças determinadas em sua própria estrutura, e não por um
agente externo.
É uma visão
não-vitalista, evolucionista (biologica e socialmente falando) e
não-reencarnacionista. Poderia também ser chamada de “Hipótese
Neurossistêmica”, porque não se opõe a algumas noções das
neurociências. A hipótese sistêmica defende a ideia de que a vida
se autoproduz, se autorregula e se complexifica, sem a necessidade de
um Deus Criador. Capra afirma isso em seus livros. A consciência
seria uma propriedade universal, mas existente em vários níveis de
complexidade. Seria o resultado do sistema, uma emergência dele, um
conceito alternativo mais amplo que o de epifenômeno na hipótese
materialista.
Dois bons exemplos
de teóricos sistêmicos são Ludwig von Bertalanfffy, autor
de “Teoria
geral dos sistemas” e Fritjof Capra, autor,
dentre outros, de “O Ponto de Mutação” e do recente e
ótimo “Visão Sistêmica da Vida” (Cultrix), escrito em
parceria com Pier Luigi Luisi. Geralmente a hipótese
sistêmica é ateia, não-reencarnacionista e sem lugar para o
“espírito”. A mente e a consciência seriam produto do conjunto,
do sistema, sendo uma propriedade “emergente”. A fenomenologia se
encaixaria aqui. A forma como a “Constelação Familiar”,
desenvolvida do falecido Bert Hellinger, encara o fenômeno humano da
mente, da consciência individual e da consciência familiar (social,
coletiva) depende das ideias desta terceira hipótese que
apresentamos.
A visão sistêmica
seria, no entender de Steve Taylor, uma espécie de
“pós-materialismo”. Ele diz em “Spiritual Science” que: “(…
) a validade do materialismo está desaparecendo e que, como
cultura, estamos nos movendo (lentamente) em direção a uma nova
fase ‘pós-materialista’.” Por não ser vitalista, mas
também não ser materialismo cartesiano, a visão sistêmica bem
merece essa alcunha. Taylor ainda diz, sobre o pampsiquismo e o
panespiritismo que: “Ambas são abordagens
‘pós-materialistas’ no sentido de que não acreditam que a
matéria seja a realidade principal do mundo e que os fenômenos
mentais podem ser reduzidos à atividade cerebral. Ambas as
perspectivas propõem que o espírito ou a mente é um aspecto
essencial do universo e não pode ser explicado em termos materiais.
Ambos também sugerem que o universo é fundamentalmente vivo e
sensível, em vez de mecanicista e inerte.”
Se a visão
materialista propõe que a consciência é um epifenômeno da
atividade neuronal e a visão metafísica propõe que ela tem uma
fonte, um “espírito” fora do corpo, a visão sistêmica
propõe que a consciência é uma emergência, o resultado de
conexões entre vários sistemas que compõem o organismo (átomos,
moléculas, células, órgãos, sistemas, até o corpo como um todo).
Tenho a sensação que o que estas três primeiras hipóteses dizem
da consciência que: ela não é nada, a não ser processos; ela é
algo fora do corpo; ela não é meramente processos, mas emergência
a partir de processos que, inclusive, se retroalimentam.
E, qual o problema
com a hipótese sistêmica? Ela contesta o epifenômeno, mas não vai
além das emergências. Não as explica e nem como elas tendem a
ocorrer. A autopoiese é uma constatação fenomenológica, mas não
uma explicação sobre os fundamentos. Isso cabe à próxima
hipótese.
D – Hipótese
Neurometafísica
A hipótese dos
neurocientistas espiritualistas. Sim, eles existem. Um bom exemplo é
o neurocientista cognitivo canadense Mario Beauregard (1962 -
), conhecido por argumentar que a matéria não é tudo o que existe
e que “a estrutura materialista não é ciência”.
Por isso, ele afirma que a mente e o cérebro devem ser entidades
fundamentalmente separadas. Isso torna a hipótese “neurometafísica”,
que também podemos chamar de “neuro-espiritual”, algo dualista,
pois reacende a dualidade mente-corpo. Também poderíamos chamá-la
de “hipótese neurovitalista” pelo mesmo motivo. Beauregard
invoca a necessidade de uma “neurociência espiritual”,
inclusive.
Beauregard escreveu
vários livros, incluindo “O cérebro espiritual: uma
explicação neurocientífica para a existência da alma”
(Best Seller, 2010), em coautoria com Denyse O'Leary, e publicado
originalmente em inglês, em 2007. Também publicou “Brain Wars:
The Scientific Battle Over the Existence of the Mind and the Proof
That Will Change the Way We Live Our Lives” (sem tradução
para o Português), em 2012. Neste livro, ele afirma que a mente e o
cérebro são fundamentalmente distintos um do outro. Entre os
argumentos que apoiam sua visão, estão os efeitos que os
pensamentos e crenças de uma pessoa podem ter no curso de doenças
como câncer e Mal de Parkinson.
Em “O Cérebro
Espiritual”, ele afirma: “O cérebro, contudo, não é a
mente; é um órgão apropriado para ligar a mente ao restante do
universo. (…) o universo é de cima para baixo, não de baixo para
cima. A mente vem primeiro e cria a matéria. Não é a matéria que
vem primeiro e cria a mente.”
Esta afirmação o
faz ser acusado de flertar com a teoria do planejamento ou design
inteligente (Intelligent Design), que nada mais é que um
teísmo criacionista velado. Beauregard é nitidamente teísta (ou,
pelo menos, deísta) e não-sistêmico em sua neurometafísica. O
seguinte trecho evidencia isso:
“(…) os
estudos neurocientíficos das experiências de fé não devem
questionar a própria fé. Pode-se interpretar o fato de o cérebro
humano ter um substrato neurológico que lhe permite experimentar um
estado espiritual como dom de um criador divino ou, se preferirem,
como contato com a natureza essencial ou propósito do universo.”
A hipótese
materialista não vê propósito no universo. A metafísica vê. A
sistêmica, não. A neurometafísica, sim.
A hipótese de
Beauregard se chama tecnicamente de “hipótese da tradução
psiconeural”. Segundo ele: “Ela postula que a mente (o mundo
psicológico, a perspectiva da primeira pessoa) e o cérebro (que faz
parte do chamado mundo ‘material’, a perspectiva da terceira
pessoa) representam dois domínios diferentes em termos
epistemológicos que podem interagir porque são aspectos
complementares da mesma realidade transcendental.”
É, portanto, uma
hipótese teísta, transcendentalista, perenialista (ele afirma isso
no livro!) e um dualismo relativo, por se propor complementar, como a
noção onda-partícula em física quântica. Beauregard só deve
escapar de ser partidário do design inteligente porque, em
algum momento do livro, diz claramente que não duvida do
evolucionismo.
O caso de David
Chalmers é um pouco diferente. “The Conscious Mind: In Search
of a Fundamental Theory” (A Mente Consciente: em busca de uma
Teoria Fundamental) é seu livro publicado em 1996. Nesta obra,
Chalmers apresenta argumentos contra as teorias materialistas da
consciência, e lança sua própria teoria dualista da consciência,
baseada em ideias da teoria da informação de Claude Shannon, que
flerta com a visão sistêmica, sem ainda constituir visão sistêmica
rigorosa.
A hipótese
neurometafísica é geralmente teísta ou semiteísta, evolucionista,
podendo ser ou não reencarnacionista e com redefinição de
“espírito”, equiparando-o a conceitos relacionados a mente e
consciência. O “Pampsiquismo” defendido por David Chalmers se
encaixa aqui.
Qual o problema com
a hipótese neurometafísica? Provavelmente, seu dualismo.
E –
Hipótese Neurometafísica Sistêmica
A inclusão de uma
visão sistêmica na hipótese neurometafísica agrega a ela a noção
de emergência, permitindo resolver o problema da hipótese anterior:
o dualismo. Se a consciência for considerada um processo emergente E
complementar, resolvemos o paradoxo da dualidade.
Esta última
hipótese também poderia ser chamada de “hipótese neurovitalista
sistêmica” ou “neurossistêmica espiritual”. Harmoniza ideias
da neurociência materialista, da espiritualidade, da visão
sistêmica, da filosofia integral, etc. Bons exemplos de expoentes
desta hipótese são: o filósofo da ciência, teórico de sistemas e
pensador integral Ervin Laszlo; o psicólogo transpessoal britânico
Steve Taylor, autor do livro “Spiritual Science”, que citamos
várias vezes, e criador do termo “panespiritismo”.
Ervin Laszlo afirma
que já os antigos místicos e sábios têm sustentado a existência
de um campo cósmico que interliga tudo nas raízes da realidade, e
que conserva e transmite informação. Ele chama este campo de Campo
A (de “akáshico”), um campo conhecido como registro
akáshico, que é integral e sistemicamente complementar com o que
ele chama de Campo M (de “manifesto”), a realidade que
experimentamos no quotidiano. Para Laszlo, esse Campo A consiste num
mar sutil de energias flutuantes de onde emerge tudo: átomos,
galáxias, estrelas, planetas, seres vivos e a própria consciência.
Esse Campo A é a constante e perene memória do universo. É um
campo informacional e mantém o registro de tudo o que já aconteceu
no cosmos e o relaciona a tudo o que virá-a-ser.
O que chamo de
“hipótese neurometafísica sistêmica” geralmente é semi-teísta
ou ateísta, evolucionista, reencarnacionista ou não e com
redefinição de “espírito”, equiparando-o a conceitos
relacionados a emergência, mente e consciência. A visão chamada
“Panespiritismo”, proposta por Steve Taylor, se encaixa aqui.
Taylor é um dos
pesquisadores mais adequados para introduzir a ideia de uma
“neurometafísica sistêmica” em um trecho do final do capítulo
3 de “Spiritual Science”:
“Do
ponto de vista espiritual, a consciência não emerge de arranjos
complexos de partículas materiais; não está localizada
em certas áreas do cérebro ou é
produzida por
certos tipos de atividade cerebral. A
consciência não emerge da matéria porque sempre esteve na matéria.
A consciência é uma qualidade fundamental que existe em todo lugar
e em tudo.
Da
perspectiva panespiritista, o
cérebro não produz consciência, mas age como uma espécie de
receptor, que transmite e canaliza a consciência universal (ou força
espiritual, que é equivalente a ela) para o nosso próprio ser.
Através do cérebro (não apenas o cérebro humano, mas o de
qualquer outro animal), a essência crua da consciência universal é
canalizada para a nossa própria consciência individual. E porque o
cérebro humano é tão grande e complexo, é capaz de receber e
canalizar a consciência de uma maneira muito intensa e intrincada,
de modo que somos (provavelmente) mais intensos e expansivamente mais
conscientes do que a maioria dos outros animais. Como o filósofo
Robert Forman colocou:
A
consciência é mais um campo do que um ponto localizado, um campo
que transcende o corpo e, de alguma forma, interage com ele... As
células cerebrais podem receber, guiar, arbitrar ou canalizar uma
consciência que de alguma forma é transcendental para elas. O
cérebro pode ser mais um receptor ou transformador para o campo da
consciência do que seu gerador.
Como
vimos, uma das razões mais óbvias para supor que o cérebro produz
consciência é que a consciência pode ser prejudicada ou alterada
se o cérebro estiver danificado. E quando o funcionamento do cérebro
é alterado em algum grau - por exemplo, por drogas -, a consciência
geralmente é afetada. No entanto, isso não invalida a explicação
espiritual da consciência. Mesmo que o cérebro não produza
consciência, mas a receba e transmita, qualquer dano ou alteração
terá um efeito igualmente significativo. Um rádio não produz a
música que passa através dele, apenas o recebe e transmite; no
entanto, se o rádio estiver danificado, sua capacidade de transmitir
a música será prejudicada. E se alguém alterar o controle de
modulação do rádio (que é análogo ao uso de drogas) ou violar
seu circuito interno, sua saída será obviamente afetada.
O
panespiritismo também se encaixa bem com a suposição dos
neurocientistas de que a consciência está de alguma forma associada
ao cérebro como um todo (apesar de não ser claro sobre os processos
envolvidos), em vez de localizada em uma parte ou padrão particular
da atividade neurológica. Se o
papel do cérebro não é produzir consciência, mas recebê-la e
transmiti-la, esperamos que seja amplamente distribuído dessa
maneira. A consciência não
depende de nenhuma parte específica do cérebro; o papel de ‘receber
e transmitir’ do cérebro depende de seu funcionamento como um todo
integrado e inter-relacionado.
Pode-se argumentar que o
panespiritismo não resolve realmente o enigma da consciência,
porque não explica de onde veio a consciência. Mas, em certo
sentido, não precisa fazer isso. A
consciência não vem de lugar nenhum - apenas é. Os físicos não
consideram necessário tentar explicar de onde vêm o
eletromagnetismo, a massa ou a gravidade - eles são apenas
construídos no universo. E o mesmo pode ser verdade para a
consciência ou força espiritual. (De
fato, a consciência pode ser ainda mais fundamental que as forças
acima, se assumirmos que ela realmente precedeu e deu origem ao
universo.)
(…)
De acordo com o panespiritismo, não
se trata apenas de termos consciência, mas de sermos consciência.
E não é uma questão de termos
consciência individual, porque compartilhamos a mesma consciência.
Isso significa que somos
essencialmente uma parte de uma unidade maior, ao invés de
indivíduos separados. Essa unidade é a fonte do altruísmo e pode
ajudar a explicar alguns tipos de experiências psíquicas. Também é
experimentada diretamente em algumas experiências espirituais ou
místicas.”
Esta
visão se aproxima de algumas ideias budistas tibetanas,
especialmente a filosofia do Dzogchen (“A Grande Perfeição”),
uma abordagem comum na tradição Nyingmapa do Vajrayana (budismo
tibetano), que na Índia – sua origem –
era conhecida pelo termo sânscrito Mahasandhi (lit. “grande
completude” ou “grande união”). Na
verdade, a tenho estudado, além de a praticar como um budista
vajrayana formal, já a muitos anos, especialmente após uma conversa
privada com um antigo amigo e que me transmitiu os primeiros
ensinamentos budistas (em 1994), Alfredo Aveline, hoje conhecido como
Lama Padma Samten. No final de uma prática conversávamos sobre
consciência e física quântica (ele é um físico, além de mestre
budista), e ele me sugeriu o seguinte: teria percebido algumas
relações entre o conceito budista de Kuntunzangpo
(Samantabhadra),
o Buda Primordial (Adi Buddha),
e a noção cabalística de Ên Sôf (ou
Ain Sôf).
Como eu já estudava Cabala naquela época, comecei a me aprofundar
em Vajrayana, Dzogchen, Mahamudra e Não dualismo em
geral. Estes
estudos e resultados de minhas práticas ficaram guardados durante
anos e, só recentemente, comecei a colocá-los por escrito em meus
artigos. Já se vão 26 anos de pesquisa e prática!
Acredito
que o não dualismo do Dzogchen, que
extrapola qualquer aspecto religioso convencional, sendo
espiritualidade pura, provê a base
filosófica para a hipótese neurossistêmica espiritual sobre a
consciência. As neurociências explicam as implicações físicas da
consciência e a visão sistêmica demonstra como a consciência
permeia o todo como um campo, o Campo A de Ervin Laszlo.
Comparando a Cabala
com o Dzogchen, desafio original que me foi dado pelo Lama Samten,
concluímos o seguinte:
Na
Cabala, há o conceito de “Tsimtsum”
(heb. “contração” ou “constrição”), segundo o qual no
momento da Criação, Deus “contrai” sua essência infinita para
permitir um “espaço conceitual” no qual um mundo finito e
independente exista. O conceito é
paradoxal, pois
exige que Deus seja ao mesmo tempo
transcendente e imanente. Ou, como sugerem
rabinos não dualistas, o paradoxo só existe do nosso lado, de nossa
percepção dualista. Da perspectiva divina só há unidade.
No
Dzogchen, se pressupõe uma base não dual, tanto para a experiência
quanto para a realidade. Mesmo não sendo uma filosofia teísta, é
uma filosofia imanentista, nascida provavelmente na Índia no início
da Era Cristã. O Dzogchen diz que uma consciência não dual de
caráter paradoxal (Tib. rigpa;
Sânsc. vidya)
é o “estado de autoperfeição” de todos os seres. Isso não
deve ser confundido com o monismo ensinado, por exemplo, por Amit
Goswami em seu marqueiteiro “ativismo quântico”. O não dual não
é imanente, nem transcendente, nem ambos. Os extremos devem ser
refutados, como fez o filósofo budista Nagarjuna. Alguns dizem que o
Dzogchen é um método para o reconhecimento da “pura imanência”
análogo ao teorizado por Deleuze e à noção de Spinoza de que o
processo da produção da vida está contido na própria vida, algo
que flerta muito com a atual visão sistêmica, com Maturana e
Varela.
A
hipótese materialista não vê propósito no universo. A metafísica
vê. A sistêmica, não. A neurometafísica, sim. A
neurometafísica sistêmica vê emergência e complementaridade,
levando à ideia não de “propósito deliberado e inteligente”
vindo da parte de um “Ser” consciente (Deus, deuses, budas
cósmicos, etc.), mas de “expressão universal por conta das
propriedade originais, naturais e emergentes”, tudo em conjunto.
Isso nos mostra que entender o fenômeno da mente e da consciência é
bem mais complexo do que imaginamos, e que usar teorias limitadas,
como o materialismo cartesiano ou mesmo as crenças meramente
intuitivas das religiões e espiritualidade mais antigas, não
resolve o problema. É necessário um trabalho em conjunto, em todas
as frentes, para se chegar a alguma conclusão válida e com a qual
se possa trabalhar para o desenvolvimento futuro da humanidade.
5
– Conclusão: Enfim, o que é Consciência?
Steve Taylor traz
sua contribuição à resposta em “Spiritual Science”:
“Consciência
é uma dessas palavras - como ‘espiritual’ ou ‘espiritualidade’
- que é usada em tantos contextos diferentes com tantas conotações
diferentes que é difícil de definir. Até estudiosos e teóricos da
consciência às vezes usam o termo com significados ligeiramente
diferentes.
(…) Então,
o que é consciência? Uma razão pela qual é difícil de definir é
porque somos nós. Somos conscientes, por isso é difícil sair de
nós mesmos e observá-la como se fosse
algo ‘outro’ para nós. Em vista disso, a melhor maneira de
entender a consciência é mais em termos de experiência do que de
definição.
(…)
O primeiro aspecto
[da
consciência] é a nossa
experiência interior de pensamentos e
sensações. Os filósofos da
consciência chamam essas experiências interiores de ‘qualia’.
No singular, um quale é
uma unidade de experiência da consciência. Um quale
pode ser o sabor de um tomate, uma sensação de
dor quando você acidentalmente toca um fogão em brasa ou um
pensamento ansioso sobre um evento futuro.
(…)
parecemos ter um centro de consciência,
um senso de “eu” com o qual estamos cientes de nossa própria
experiência. Isso significa que não
temos apenas experiência, também estamos cientes disso. Em
outras palavras, essa é a parte de nós que é auto-consciente. Ela
observa nossos pensamentos, observa nossas
interações com outras pessoas, comenta e critica nosso
comportamento, e assim por diante. Esse observador auto-consciente é
um segundo aspecto da consciência.
(…)
a consciência inclui nossa percepção
do ambiente que a rodeia. Essa
consciência trabalha através dos nossos sentidos e nos coloca em
contato com o mundo fora de nós. Este é o terceiro aspecto da
consciência.
(…)
Em termos do primeiro aspecto - experiência
interior -, o filósofo Descartes
acreditava que apenas os seres humanos têm mentes (ou almas) e que
os animais são apenas autômatos. Mas a maioria dos filósofos
modernos seria mais cautelosa, pois é obviamente impossível saber
se os animais têm alguma consciência subjetiva - ou qualia
- ou não. Ao mesmo tempo, parece aparente que
muitos animais têm a capacidade de sentir dor, medo e até tristeza
(como quando elefantes, macacos e cavalos parecem sofrer por parentes
falecidos). Obviamente, isso sugere algum grau de experiência
interior.
Em termos do segundo aspecto, há evidências de
que alguns animais possuem um certo grau de autoconsciência.
Vários animais - incluindo chimpanzés, bonobos, elefantes e até
pombos pegas da Eurásia - passaram no ‘teste de
auto-reconhecimento de espelhos’.
(…)
Em termos do terceiro aspecto, podemos
dizer com segurança que todos os animais têm algum grau de
consciência de seu entorno.
Até uma ameba unicelular se move em direção à luz e às fontes de
alimento, mostrando a consciência do ambiente. E quanto mais
fisicamente complexos os animais se tornam,
mais demonstram consciência de seus arredores. Portanto, nesse
sentido, a questão importante não é se os animais são
conscientes, mas o quão conscientes são.”
Este
“grau de consciência de seu entorno” que os animais teriam em
algum grau, conforme Taylor, equivale ao que Capra e outros
sistêmicos chamam, na verdade, de Cognição,
diferenciando-a de Consciência
no sentido que estamos utilizando neste ensaio. Como se pode ver,
esbarramos em vários problemas, sendo um deles, e não menos
relevante, o da nomenclatura e das definições. O aspecto subjetivo
da mente, da
inteligência, da cognição
e da consciência é um dos culpados desta dificuldade.
Continuum
mental, Campo A (Akáshico) e Mente Una. Estas
três noções podem explicar a consciência de um modo novo. Buda,
Laszlo e Dossey, três mentes brilhantes, as duas últimas separadas
da primeira por 2500 anos.
O
Campo A de Laszlo é um campo informacional que conecta tudo, em
todos os tempos. Na verdade, da perspectiva total, o passado e o
futuro não existem, mas um presente contínuo, o que se assemelha a
visão de continuum
mental-temporal do Dzogchen. Se a perspectiva é de nós para o Campo
A (de baixo para cima),
o vemos como Mente Una, Deus, Buda Primordial ou o que o valha. Se a
perspectiva é do Campo A para nós (de
cima para baixo), uma perspectiva que
apenas seres iluminados ou pelo menos muito
elevados poderiam ter, o vemos como
continuum
mental, como Consciência Primordial, da qual fazemos parte
integralmente. É, portanto, uma mera questão de perspectiva.
A
consciência seria, então, o fundamento do universo. Manifesta-se em
vários níveis de complexidade, desde as cognições atômicas,
moleculares e celulares, até a cognição corporal-cerebral e, mais
além, como mente e consciência superior. Tudo viria da mesma
origem, sistemicamente enrolada ou dobrada,
implícita,
usando um termo do físico David Bohm em sua teoria da Ordem
Implicada. Quando nascemos, esta consciência universal ou imersa no
Todo, se desenrola
ou se desdobra
nos diversos sistemas que constituem o universo físico. Quando
morremos, esta consciência se enrola novamente,
se esconde, mas
nisso volta a ser livre, e volta ao oceano
do qual ilusoriamente se afastara no nascimento. Tudo isso deve ser
entendido em conjunto e não separado: o eu (incluindo o corpo), o
outro (os objetos de percepção, sejam
materiais ou culturais) e o nós (o todo
sistêmico), formando um tripé mais interessante que os quadrantes
de Ken Wilber, no entendimento de seu ex-colega, Steve McIntosh.
Sobre o autor
Paulo
Stekel é instrutor de
Meditação Não-dualista, orientador
do Projeto Mahasandhi de Meditação Livre Não-Religiosa,
pesquisador
de Religiões e Espiritualidades, praticante
budista desde 1995 (seu
nome budista vajrayana
é Pema Dorje),
membro
do NEDEC²- Núcleo de Estudos e Desenvolvimentos em Conhecimento e
Consciência (UFSC – Florianópolis – SC). Tem
experiência na área de Linguística, com ênfase em
Paleolinguística. É escritor, tradutor, revisor, músico,
com vários álbuns lançados desde 2009.
É um pesquisador não-acadêmico, professor de Cabala Não-dualista,
Sânscrito e línguas sagradas. Especialista na interpretação dos
textos sagrados das religiões. Nasceu e cresceu em Santa Maria (RS).
Atualmente reside em
Florianópolis (SC). Proponente da Hierolinguística
(uma
nova ciência para o estudo das linguagens sagradas proposta em seu
livro “Santo & Profano - estudo etimológico das línguas
sagradas”, publicado em 2006).
Publicou diversas obras: “Elohê Israel (Os deuses de Israel) -
filosofia esotérica na Bíblia” (Independente, 2001); “Projeto
Aurora - retorno à linguagem da consciência” (FEEU, 2003); “Santo
e Profano - estudo etimológico das línguas sagradas” (GEFO,
2006); “Deuses & Demônios - verdades inauditas e mentiras
anunciadas sobre os anjos” (Independente, 2007); “Curso de Cabala
- com noções de Hebraico & Aramaico [vol. I e II]”
(Independente, 2007 e 2008); “Curso de Sânscrito - com noções de
Filosofia Indiana [vol. I e II]” (Independente, 2008 e 2009); “A
Alma da Palavra” (independente, 2011). Pesquisador aceito como
paleolinguista de formação livre na pesquisa de decifração da
escrita Glozélica (França), com trabalho científico reconhecido e
publicado em Inglês no website do Museu de Glozel
(http://www.museedeglozel.com/Trad2000.htm)
desde 2006. Pesquisador aceito como paleolinguista de formação
livre pelo arqueólogo bósnio-americano Semir Osmanagic na pesquisa
de decifração da escrita Proto-Visoko (Bósnia), com trabalho de
decifração preliminar apresentado em Sarajevo pelo egiptologista
Muris Osmanagic (2010) e publicado no website Bosnian Pyramids, em
Inglês e Bósnio:
http://icbp.ba/2008/documents/papers/ICBP_Referat_Stekel.pdf.